A autora louca

 
 
Eu não sou escritora, não sou poetisa, nem psicóloga e nem atriz. Por mais que eu queira ser! Para me expressar na vida, gosto de escrever sobre os meus relacionamentos amorosos ou porque é aniversário de alguém especial. Não com tanta frequência. Sou advogada, e profissionalmente, obrigada a peticionar, contestar, interpor, impetrar, propor... os mais diversos tipos de ações judiciais e utilizar um vocábulo distante daquele que uso habitualmente quando realmente sou eu, de havaianas, short rasgado, cabelo emaranhado ou com um boné na cabeça... quando realmente estou vestida de mim.
 
Até à adolescência, eu nunca consegui ir ao fim com um diário, agenda, blog, por mais que eu tenha inventado muitos deles. Sempre fui de enjoar fácil das coisas e estranhar a rotina. No começo era novidade, depois já havia achado um passa tempo melhor e tudo aquilo ia ficando para o canto. Me lembro que sempre quando eu chorava, sentia a necessidade de escrever tudo que me angustiava na primeira folha de papel que encontrava.
 
Nesse sentido, as últimas folhas dos meus cadernos escolares eram rabiscadas com meus contos e desabafos. Às vezes eu os esquecia ali, outras vezes rasgava assim que terminava. Até hoje, vira e mexe, eu encontro algumas páginas inteiras escritas por mim. Quando me esquecia de rasgar, a minha mãe acabava encontrando, e eu sentia muita vergonha da minha alma estar sendo exposta a outrem, por mais que esse outrem fosse a minha mãe.
 
Com meus treze pra quatorze anos, eu comecei a me envolver com os meninos da minha idade, sentir o frio na barriga, querer estar perto de alguém, e pouco a pouco ia sendo apresentada à dor da rejeição. Cresci tendo muitas dificuldades de falar sobre os meus sentimentos, foi aí que, após algum tempo, logo na minha primeira paixão, encontrei na escrita um refúgio, e passei a produzir algo que realmente poderia ser chamado de texto e capaz de prender a atenção daquele garoto em específico, hoje rapaz.
 
O pior é que diferente dos outros caras que só leem o primeiro parágrafo dos milhares de textos aos quais se deparam na vida, ele gostava de ler e de ser o protagonista principal da minha história. Acho que o ego subia! Parecia que gostava de me fazer sofrer, só pra me ver escrever, pois sempre foram esses os textos mais bonitos que eu já o enviei. Passou-se muito tempo, e eu ainda achava que era amor...
 
Me dizia que chorava e logo em seguida, me pedia desculpas. Sempre foi tão previsível. Eu sempre o conheci tanto, que poderia ter deixado a minha teimosia de lado, e aceitado que as lágrimas não existiam e as desculpas eram vagas, pois os seus erros permaneciam os mesmos. Aceitado, ainda, que, o nosso fim, não seria juntos. Era tudo tão óbvio!
 
Por outro lado, ele era a minha inspiração e eu a autora louca, eu me sentia tímida, mas no fundo gostava dos elogios que recebia, e principalmente, do que ele “tentava” me escrever só pra falar de mim e me retribuir de alguma forma. Pensando bem, era nessa parte que ele me ganhava. Mas acho que só guardo o último que me fez.
 
Hoje, eu também queria ter a chance de ler tudo que já desabafei e me declarei por meio dos versos, parágrafos e entrelinhas, seja para presentear uma pessoa especial ou algum momento de dor ou alegria, mas isso sempre foi pedir demais para o meu alto nível de desorganização.
 
 Sobre a minha vida, às vezes posto alguma coisa, e por mais que encho de mensagens subliminares e informações implícitas, via de regra, me sinto nua demais com toda a minha alma exposta, e tenho mania de deletar. Tudo depende do meu estado de humor.
 
 Sinceramente, eu escrevo para me sentir bem, é como uma terapia, não acho que seja capaz de interessar quem não seja meu personagem, quem esteja fora do meu enredo. Eu até gosto de ser a autora louca, uma vez que fantasias e mentalidade fértil nunca me faltaram. Alguns me chamam de poetisa, outros pedem somente conselhos, de escritora a psicóloga, por mais que o meu sonho de infância pudesse ter sido outro. E na realidade, sou apenas operadora do Direito.
 
Nesta oportunidade, em vez de me sentir novamente nua por não ter a dimensão da quantidade de pessoas que estão lendo a minha alma, me sinto bem vestida, não com o meu terno utilizado à trabalho, nem com o meu short rasgado das horas vagas... Hoje, estou com algum traje específico para uma ocasião especial, um salto quinze, e o meu batom vermelho. Tudo isso pela gratidão de poder participar do projeto de alguém que, ao contrário de mim, sempre teve coragem de se expor além. “Soul free”. Obrigada pelos sonhos!
Com carinho,
De autora louca para uma mais louca ainda.
 

Morgana Tavares

"Tenho privilégios que não comportam toda a minha gratidão: respiro, ando, abraço, amo, choro, produzo, trabalho, escrevo. E por escrever sou amada. Por gargalhar sou fotografada e vocês escutam de longe minha risada."
 (Marla de Queiroz)